Tartarugas marinhas da Guiné-Bissau: para onde vão?

Juntamente com outra fauna icónica, como os manatins, hipopótamos, papagaios e várias espécies migratórias de aves marinhas e limícolas, a tartaruga-verde abunda no encantador Arquipélago dos Bijagós. No extremo sul dos Bijagós, encontra-se o Parque Nacional Marinho João Vieira e Poilão (PNMJVP). A mais pequena ilha do Parque, Poilão (10 ° 52'N, 15 ° 43'W), com uma praia que se estende por apenas 2 km, abriga uma das mais abundantes colónias de tartarugas-verdes do mundo, terceira maior no Atlântico, e a mais importante em África, com uma média de 27 000 ninhos por ano (2013 - 2017).

 

Figura 1. Ilha de Poilão, onde se encontra uma das maiores populações de tartarugas-verdes nidificantes do mundo.Créditos: MVarela

 

Dentro do atual projeto financiado pela Fundação MAVA; 'Consolidação da Conservação das Tartarugas Marinhas no arquipélago dos Bijagós, a Guiné-Bissau', os investigadores Prof. Paulo Catry e Dra. Rita Patrício do MARE – ISPA, Instituto Universitário associou-se ao IBAP (Instituto da Biodiversidade e Áreas Protegidas da Guiné-Bissau) para investigar os movimentos das tartarugas-verdes dentro da área de reprodução e ao longo de sua migração pós-nidificação.

Durante a temporada de nidificação de 2018, colocaram-se 20 dispositivos de localização por satélite em fêmeas de tartarugas-verdes encontradas a nidificar em Poilão de Agosto a Novembro. As tartarugas foram ainda identificadas com anilhas e microchips (identificadores electrónicos – PIT tags). Graças à tecnologia de satélite, estamos a acompanhar de perto as deslocações diárias dessas tartarugas-verdes, e temos já algumas descobertas muito interessantes.

 

Figura 2. Investigadores a colocar transmissores de satélite em tartarugas-verdes e vistas aéreas das praias de desova da ilha de Poilão. Créditos: MVarela

 

Descobrimos que algumas fêmeas de Poilão desovam também nas ilhas do Meio e Cavalos, também dentro do PNMJVP, o que vem confirmar as informações já obtidas pela colocação de anilhas e as recapturas nas diferentes ilhas do PNMJVP. Outras aventuram-se para fora dos limites da área marinha protegida (AMP) entre as desovas, algo inesperado, pois normalmente as tartarugas marinhas descansam perto da praia de nidificação enquanto se preparam para a próxima desova. 

 

Figura 3. Transmissores satélite e tartarugas-verdes com o transmissor a dirigirem-se para o mar após a desova. Créditos: MVarela e RPatrício

 

Por fim, quando terminam de desovar, as tartarugas-verdes iniciam a sua migração para locais de alimentação distantes e, pela primeira vez, temos evidência de diferentes estratégias de alimentação ​​para a população nidificante de Poilão, com algumas tartarugas alimentando-se nas águas costeiras da Gâmbia, do Senegal e da Mauritânia, outras perto da ilha de Bolama, e ainda outras no sul de Poilão. E, talvez o mais inesperado, algumas destas tartarugas parecem residir no arquipélago e não migram de todo.Um estudoanterior de seguimento por satélite, em 2001, tinha já demonstrado a importância do Banc d'Arguin, Mauritânia, como um local de alimentação para esta população, e sugeriu a existência de rotas migratórias variáveis, no entanto, tanto o tamanho da amostra como as durações de seguimento foram limitados, portanto os resultados foram inconclusivos. 

 

Figura 4. Direita: percurso de uma tartaruga-verde residente no arquipélago dos Bijagós; a linha amarela tracejada representa o Parque Nacional Marinho João Vieira e Poilão; percursos de seis tartarugas-verdes marcadas em Poilão que se deslocaram para diferentes locais de alimentação, ilustrando diferentes estratégias na procura de alimento; três indivíduos dirigiram-se para norte até locais distintos na Gâmbia, Senegal e Mauritânia, dois indivíduos dirigiram-se para a Guiné-Bissau continental, ficando perto da ilha de Bolama, e uma dirigiu-se para sul. Mapas: RPatrício

 

Os movimentos registados durante os intervalos entre desovas serão essenciais para redefinir e renegociar os limites do parque, enquanto o conhecimento sobre as rotas migratórias pós-nidificação e a conectividade entre as áreas de reprodução e de alimentação será fundamental para entender as ameaças a essa população fora da AMP, para identificar áreas de conflito com actividades de pesca e para estabelecer colaborações com projetos de conservação de tartarugas marinhas dentro da região.

 

Rita Patrício e Daniel Lopes