Bernardo Quintella no podcast “Palavras de Cientista”

O investigador do MARE Bernardo Quintella, foi o mais recente convidado do podcast “Palavra de Cientista”, conduzido por Eduardo Canelas. Na conversa, o investigador do MARE apresentou os resultados do seu estudo pioneiro de repovoamento do mero (*Epinephelus marginatus*), uma espécie emblemática da costa portuguesa e classificada como “Em perigo” na Europa. 

O projeto foi desenvolvido por investigadores do MARE/ARNET, em colaboração com a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (CIÊNCIAS ULisboa) e a Universidade de Évora. A investigação demonstrou que um curto período de aclimatização no mar, em jaulas marinhas, pode aumentar significativamente o sucesso das ações de repovoamento.

“Com uma pequena alteração no procedimento, conseguimos aumentar de forma muito significativa a fidelização espacial dos meros à área de libertação”, explicou Bernardo Quintella. “Ao fim de praticamente um ano, 50% dos meros que tiveram aclimatação ainda permaneciam na área de estudo.”O estudo surgiu da necessidade de acelerar a recuperação natural da espécie, outrora abundante na costa alentejana e vicentina, mas atualmente rara devido à pesca excessiva e à sua própria vulnerabilidade. O mero é um peixe territorial, que habita zonas específicas e facilmente identificáveis, o que facilita a sua captura e dificulta a regeneração natural das populações.

A primeira fase do projeto, realizada em 2019, envolveu a libertação de 20 meros subadultos criados em cativeiro pelo IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera), na zona da Ilha do Pessegueiro. No entanto, os resultados foram limitados: os peixes abandonaram rapidamente a área de estudo.

Já numa segunda fase, em 2021, os investigadores testaram um novo protocolo. Um grupo de meros permaneceu em jaulas de aclimatação no porto de Sines durante cinco semanas antes da libertação, enquanto outro grupo foi libertado diretamente após o transporte. Os resultados não deixaram dúvidas: os peixes aclimatados permaneceram significativamente mais tempo na zona protegida.

A investigação avança agora para uma terceira fase, com apoio da Fundação Viridia, que permitirá a produção e libertação de milhares de juvenis de mero. Estes serão introduzidos na natureza ainda mais jovens — com cerca de um ano e 20 centímetros — para avaliar a eficácia do repovoamento em escala maior.

Bernardo Quintella também abordou os desafios da reprodução em cativeiro, apontando a complexidade do comportamento social da espécie, que inclui mudanças de sexo ao longo da vida. “Curiosamente, os peixes têm de gostar uns dos outros. “Já aconteceu haver essa introdução e o macho não ter gostado da fêmea ou outra fêmea não ter gostado da segunda fêmea que foi introduzida e acaba por acontecer aí, alguns comportamentos menos desejáveis”, relatou.

O investigador sublinha que o mero é um indicador ecológico da qualidade ambiental das áreas marinhas protegidas. “A presença desta espécie revela que o ecossistema está bem conservado. Proteger o mero é proteger todo um conjunto de espécies marinhas.”

Apesar do otimismo, Quintella defende que o objetivo final deve ser a recuperação natural da espécie, sem necessidade de repovoamentos contínuos. “Espero que no futuro o mero consiga fazer o trabalho que sabe melhor do que nós: colonizar os habitats e promover a resiliência da população.”

Este estudo, embora centrado no mero, poderá servir de modelo para outras espécies marinhas, reforçando a importância da ciência na conservação da biodiversidade.

 

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