Graça Martinho e Paula Sobral no documentário “Para onde vai a Reciclagem?”

As investigadoras do MARE Graça Martinho e Paula Sobral, participaram no documentário da RTP “Para Onde Vai a Reciclagem?”, um apelo urgente à ação num momento em que Portugal enfrenta o desafio de cumprir metas ambiciosas de recolha e reciclagem de resíduos. 

O documentário, recentemente exibido pela RTP, explora os grandes desafios associados à gestão de três dos principais tipos de resíduos domésticos: embalagens, pilhas e equipamentos elétricos usados. Com testemunhos de especialistas, autoridades e organizações ambientais, o filme ilustra o percurso dos resíduos quando corretamente encaminhados.

Graça Martinho, especialista em resíduos urbanos, sublinha os riscos ambientais e económicos de manter equipamentos elétricos em casa ou descartá-los incorretamente. “Guardar em casa ou deitar para o caixote do lixo dos indiferenciados? Nem uma nem outra solução são as mais indicadas e as mais corretas”, afirma. Segundo a investigadora, estes equipamentos contêm materiais valiosos — como plásticos, metais comuns e metais raros — que, se não forem reciclados, ficam “aprisionados” e não voltam à economia circular. “Colocar nos indiferenciados, normalmente vai parar ao aterro e fica lá também para sempre”, alerta.

Em relação às pilhas, Graça Martinho revelou dados de um estudo que mostram que cada família portuguesa guarda em casa, em média, cerca de 80 pilhas- muitas já usadas, acumuladas em caixas, à espera de um destino. O problema, sublinha, é que pilhas contêm substâncias tóxicas. “Podem ter mercúrio, chumbo, metais perigosos para a saúde, com consequências para os nossos rins, fígado, sistema nervoso central. Se abandonamos isto, vão-se libertando químicos perigosos e contaminando o ambiente. E se o ambiente está contaminado, isso vai pôr em risco a nossa saúde”.

Outro foco de preocupação são os gases florados presentes em frigoríficos, que embora não prejudiquem a camada de ozono, “têm um grande potencial de aquecimento global, sendo até 2300 vezes mais perigosos que o CO₂”, refere Graça Martinho. O problema agrava-se quando estes equipamentos são vandalizados na rua para extração de cobre, libertando os gases diretamente para a atmosfera.

Já Paula Sobral, especialista em poluição marinha, abordou o problema das embalagens de plástico, cuja presença no ambiente é cada vez mais persistente. “O principal problema é que esses materiais no ambiente não se degradam, e portanto estão lá para sempre. Virtualmente estima-se que todo o plástico que foi produzido até hoje ainda exista. Existe em tamanhos menores, degradado, tendo já se tornado quebradiço e produzido as tais partículas cada vez mais pequenas, mas de facto degradar-se completamente, desaparecer, estima-se que isso não tenha acontecido”, afirmou.

Paula Sobral sublinha que o problema vai além da ação individual e exige um esforço conjunto. “A culpa do problema não pode estar apenas no consumidor. Isto é um problema transversal a muitos setores da sociedade. Claro que o consumidor tem culpa, mas a indústria também tem de repensar os seus processos, conter a sua matéria-prima e desenhar embalagens mais recicláveis”.

Para além disso, a investigadora alerta para o consumo excessivo de plásticos e outros materiais: “Reciclamos muito pouco, é esta a principal mensagem. Temos de reciclar muito mais e eliminar alguns plásticos que não são necessários. Há muitas embalagens que não são necessárias, são embalagens dentro de embalagens dentro de embalagens. Há muita coisa ainda a fazer no sentido de usarmos menos plástico, porque é isto que temos de fazer: é usar menos. Mas isso não é só do plástico — é relativamente a tudo. Temos um estilo de vida que não é comportável com a sustentabilidade do planeta.”

“Para Onde Vai a Reciclagem?” é mais do que um documentário, é um alerta coletivo. A forma como cada cidadão gere os seus resíduos pode parecer uma decisão pequena, mas tem consequências amplas para a saúde pública, o ambiente e o futuro do planeta.