Projeto CoastNet 2030 arranca oficialmente em Setúbal com nova fase de monitorização estuarina

O auditório do ICNF, em Setúbal, foi pequeno para acolher os quase 50 participantes que estiveram presentes, no passado dia 25 de junho, no lançamento oficial do projeto CoastNet 2030, que marca uma nova etapa da CoastNet – Rede Portuguesa de Monitorização Costeira. Com financiamento do Programa Operacional MAR 2030, o consórcio liderado pelo MARE/ARNET/Faculdade de Ciências da Universidade Lisboa e pela Universidade de Évora dá agora início a uma fase de expansão, tanto tecnológica como territorial, que se prolonga até dezembro de 2026. 

Uma abertura feita de alianças
A sessão contou com uma ampla representação de organismos públicos, universidades e empresas: a Administração dos Portos de Lisboa (APL), a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), a AquaSado, a BlueOasis – Engenharia e Inovação Sustentável no Oceano, a Capitania do Porto de Setúbal, a Câmara Municipal de Setúbal, a Escola Superior de Tecnologia de Setúbal, a ExporSado, a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), o Instituto Hidrográfico (IH), o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), o MARE e a WavEC – Offshore Renewables (WavEC).
Na abertura, Isabel Moura Ramos, da APSS, assumiu “um compromisso muito claro em defesa do estuário do Sado”, reconhecendo que a atividade portuária tem impacto, mas sublinhando que “é com estas medidas que conseguimos monitorizar, atuar preventivamente e garantir que o desenvolvimento acontece em equilíbrio com a vida marinha”.

Em representação da Direção do MARE, Helena Adão, investigadora da Universidade de Évora, descreveu o CoastNet como “um projeto-bandeira” e de grande relevância para o país no contexto dos estuários, “um caso raro mesmo a nível internacional”. Destacou ainda o papel da ciência como base para decisões públicas bem fundamentadas e próximas da realidade.
Já Margarida Santos Reis, subdiretora da FCUL, lembrou que muitas infraestruturas em Portugal estão hoje paradas por falta de financiamento, tornando o apoio ao CoastNet ainda mais relevante. “O acesso livre aos dados é essencial para a ciência contemporânea”, afirmou.

O que traz de novo o CoastNet 2030?
Na apresentação técnica da infraestrutura, José Lino Costa, investigador e professor MARE/ARNET/FCUL e coordenador da infraestrutura CoastNet, recordou que a rede, criada em 2017, já cobre a zona costeira, com recurso a dados de satélite, e os estuários do Tejo, Mondego e Mira com boias multiparamétricas que transmitem dados a cada 15 minutos. A rede inclui ainda recetores acústicos que acompanham o movimento de várias espécies de peixes. O geoportal, de acesso aberto, já conta com mais de 7 700 utilizadores e tem apoiado dezenas de projetos científicos e académicos.

Coube a Ana Brito, investigadora e professora MARE/ARNET/FCUL e coordenadora do projeto CoastNet 2030, apresentar as cinco frentes de ação que vão orientar o projeto até 2026. O plano inclui a atualização e expansão da rede de monitorização, com destaque para a instalação, já neste verão, de uma sonda multiparamétrica numa boia próxima de Tróia, que vai permitir acompanhar em permanência as condições no estuário do Sado. Serão ainda instalados hidrofones nos, com o objetivo de monitorizar o ruído subaquático e “escutar” os ecossistemas. O projeto inclui o desenvolvimento de produtos de satélite de alta resolução, a criação de novos indicadores ambientais úteis para a Diretiva Quadro da Água e a Estratégia Marinha, e uma modernização profunda do geoportal, agora preparado para o futuro com integração automática de dados e novas funcionalidades de visualização, acesso e partilha.
“Realizar observações contínuas, quer de forma remota, quer no terreno, é a única maneira de percebermos as mudanças rápidas que ocorrem nos nossos estuários”, referiu Ana Brito, sublinhando também que “a manutenção dos equipamentos, sujeitos às intempéries, é um dos grandes desafios que este projeto vem ajudar a ultrapassar”.

Tecnologia em ação no Sado
Depois das apresentações, os participantes embarcaram no “Maravilha do Sado” para uma demonstração técnica. A bordo, a equipa do MARE mergulhou a sonda que será instalada na nova boia, e os dados começaram a surgir no computador: temperatura, salinidade, oxigénio, pH, clorofila e turbidez, tudo em tempo real. Um hidrofone captou o som da corvina-real, mostrando como a tecnologia permite ouvir o que antes era inaudível.
Durante a saída de campo, houve espaço para troca de impressões sobre o potencial da infraestrutura. “Estas iniciativas ajudam-nos a medir o nosso impacto e a criar soluções equilibradas entre desenvolvimento e conservação”, reforçou Isabel Moura Ramos, da APSS. Representantes do IPMA destacaram que a expansão da rede permitirá a Portugal responder de forma mais eficaz às obrigações de avaliação do bom estado ambiental das águas, enquanto o ICNF sublinhou a importância dos dados para a gestão e tomada de decisão. A APA valorizou a base científica que a monitorização contínua oferece à definição de novas políticas e estudos. O Instituto Hidrográfico e a própria APSS convergiram numa ideia-chave: “Só conseguimos falar de alterações climáticas se tivermos séries longas de dados”. No final, todos os presentes estiveram de acordo que o reforço da infraestrutura potenciará a colaboração entre as várias entidades com atuação nesta área.

Um compromisso para o futuro
A infraestrutura CoastNet afirma-se como um pilar estratégico para a monitorização costeira em Portugal. Com o projeto CoastNet 2030, reforça-se não só a capacidade tecnológica e territorial da rede, como também a sua utilidade pública, num esforço coordenado pelo MAR/ARNET que traduz o compromisso da ciência com a sustentabilidade dos ecossistemas marinhos e com a qualidade das decisões que os afetam.

Financiamento
O CoastNet 2030 é apoiado pelo MAR 2030 – Aviso ‘Apoio à Proteção e Restauro da Biodiversidade e dos Ecossistemas Marinhos’ e decorre de janeiro 2025 a dezembro 2026, reforçando o papel do MARE na produção de conhecimento aberto para políticas públicas, inovação empresarial e literacia oceânica.

 

 

Texto de Vera Sequeira, José Lino Costa e Ana Brito
Fotografias de Vera Sequeira