Com um registo fóssil que remonta a mais de 280 milhões de anos, a lampreia representa uma das espécies mais antigas e evolutivamente resilientes do reino animal. No entanto, apesar desta longevidade, a espécie encontra-se atualmente classificada como "em perigo crítico" na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). A resposta a esta crise biológica está a ser coordenada por Pedro Raposo de Almeida, investigador e diretor do MARE.
Desde o início de 2024 que Pedro Raposo de Almeida lidera cientificamente um projeto de conservação no rio Mondego, inserido no programa europeu Dalia, promovido pela Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra. A principal medida implementada consiste na translocação de indivíduos adultos de lampreia — capturados no estuário e no Baixo Mondego — para troços superiores do rio, a montante de Coimbra, com o objetivo de potenciar o sucesso reprodutivo da espécie.

“Uma das ações mais importantes (do projeto) é a translocação [transferência das espécies de uma área para outra] de lampreias adultas da zona onde são pescadas, no Baixo Mondego e no estuário, para o troço superior, a montante de Coimbra, para aumentar o sucesso reprodutor da espécie”, esclarece Pedro Raposo de Almeida
à revista Sábado. “Ao promovermos o sucesso da reprodução, aumentamos o número de larvas”.
A operação de campo envolve a colaboração com pescadores locais e a utilização de armadilhas tradicionais conhecidas como botirões, cuja configuração em funil permite capturas seletivas. As lampreias capturadas são transportadas em veículos equipados para assegurar as condições ideais de sobrevivência e posteriormente libertadas em habitats propícios à desova.
Entre 16 de março e 4 de abril foram capturados apenas 30 exemplares, um número significativamente inferior ao esperado. “Em anos de abundância, capturam-se por noite dezenas de animais. Já neste período, houve noites em não se apanhou nenhum”, lamenta o investigador.
De acordo com Pedro Raposo de Almeida, a lampreia-marinha perdeu cerca de 80% do seu habitat disponível na Península Ibérica desde meados do século XX, essencialmente devido à construção de infraestruturas hidráulicas. Paralelamente, a elevada pressão de pesca — com taxas de mortalidade superiores a 60% — constitui um fator adicional de ameaça. “Nenhuma outra espécie aguentaria o que andam a fazer à lampreia”, sublinha.
A escassez atual tem levado a aumentos significativos no valor comercial da espécie, com preços que ultrapassam os 100 euros por unidade no primeiro ponto de venda, o que reforça a necessidade urgente de gestão sustentável e conservação.
Além da translocação, o projeto contempla ações de mapeamento de santuários larvais no verão, que visam proteger zonas críticas do ciclo de vida da espécie. Estão igualmente previstas campanhas de sensibilização dirigidas à comunidade ribeirinha, com o intuito de reduzir práticas informais de captura que agravam ainda mais a pressão sobre a população reprodutora.
Pedro Raposo de Almeida considera essencial que estas medidas sejam replicadas noutros sistemas fluviais, e que a conservação da lampreia requer uma abordagem integrada, multirregional e sustentada no tempo. O conhecimento científico acumulado e a colaboração com as comunidades locais são elementos chave para reverter o atual declínio populacional.
Fotografia de Filipa Silva