Entrevista especial: A Literacia do Oceano no MARE

A coordenadora da LT – Governança e Literacia, Lia Vasconcelos, explica-nos a aposta do MARE na Literacia do Oceano que levou a que quatro projetos MARE ganhassem o financiamento EEA Grants.

 

Qual foi a maior razão que levou o MARE a apostar na Literacia do Oceano?

O MARE sendo um Centro especialmente vocacionado para o Mar considera que a Literacia do Oceano constitui uma aposta estratégica para uma sensibilização alargada da sociedade civil para os impactes causados sobre este meio aquático, uma vez que 80% do lixo marinho é originário em terra. São, pois, os nossos comportamentos que geram uma situação que se não for revertida rapidamente nos levará a perder um dos recursos mais profícuos do Planeta. Nesta linha, uma consciencialização alargada da sociedade para esta problemática e a sua origem assume aqui um papel crucial.

 

De que forma tem esta aposta sido notável?

Para além destes projetos, o MARE e os seus investigadores têm vindo a impor-se nesta área da Literacia do Oceano noutros projetos Europeus e Internacionais, que se apoiam no envolvimento alargado de stakeholders para a resolução conjunta de problemas e definição de estratégias a serem integradas nas políticas ligadas ao mar. Entre estes encontram-se, nomeadamente, Marlisco (2012-15 ,FP7) onde se visava uma difusão alargada desta problemática tendo o Marlisco Portugal sido reconhecido internacionalmente através do prémio RRI 2015 (Responsible Research Innovation), OceanWise (2018-21) Interreg Altantic Area ainda a decorrer e que visa o desenvolvimento colaborativo de diretrizes políticas ao nível do Atlantico Nordeste, o CAPonLITTER (2019-23, Interreg Europe) que procura estratégias eficientes para a resolução das tampas plásticas no mar. Todos estes projetos visam, a partir de processos colaborativos, encontrar soluções para o lixo marinho, e ao fazê-lo contribuir para a promoção de espaços de diálogo que geramaprendizagens coletivas ao nível da literacia do oceano, e consequentemente levam a uma transformação social ao tornar os indivíduos envolvidos em agentes conscientes, responsáveis e interventivos na defesa deste recurso.

 

O que, na sua opinião, distingue os projetos que foram selecionados neste concurso (EEA Grants)?

Os projetos selecionados revelam não só uma multiplicidade de parcerias, mas também uma variedade de abordagens. Ao nível das parcerias estas ocorrem, nomeadamente, entre polos do MARE, comunidade escolar (professores e alunos das escolas), associações, câmaras municipais, entre sectores e, também, com o envolvimento mais alargado do setor publico e privado. Estas redes são fundamentalmente nacionais, mas um dos projetos (Kids Dive Portugal-Noruega) aposta numa ligação internacional de intercâmbio com uma escola da Noruega.

Ao nível das abordagens que promovem a relação com a comunidade escolar envolvendo professores e alunos, os grupos-alvo de estudantes cobrem uma vasta faixa etária que vai até aos 17 anos. No projeto que se propõe usar os Living Labs para sistemas costeiros salinos envolvendo o setor publico e privado o grupo-alvo considerado andará pela idade adulta.

Deste modo, eu diria que há uma preocupação generalizada de enveredar por processos de ensino e aprendizagem multigeracional ao nível da literacia do oceano apoiada numa atitude “hands on” e espaços de diálogo como forma de comunicar a ciência através de experiências coletivas.

 

Como coordenadora da LT – Governança e Literacia qual acha que será o “caminho” a partir daqui? Quais são as diretrizes? E o que não pode faltar para que esta linha prossiga, neste momento?

O caminho só se faz caminhando, e penso que esta Linha Temática tem vindo a impor-se e a expandir envolvendo um número cada vez maior de investigadores do MARE, procurando formatos alternativos inovadores como forma de contribuir para o reforço da Governância e Literacia ao nível do oceano. Para além do dinamismo apresentado na implementação de projetos, o intercâmbio de aprendizagens só poderá reforçar esta linha e contribuir para a sua visibilidade. Este esforço tem sido feito através da implementação do GOVLab[1] que procura reforçar a rede de investigação nesta componente, não só entre os polos do MARE, mas também com outras entidades e a própria sociedade, uma vez que a resposta de sucesso, como é nossa convicção, está nas pessoas.

 

De uma forma geral, de que forma a aposta em projetos orientados para a promoção da Literacia do Oceano poderá contribuir para a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável da UNESCO (UNESCO Ocean Decade)?

Como já foi acima referido, a promoção da literacia do Oceano é um elemento crucial e um contributo imprescindível para o sucesso da Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável da UNESCO, pois a educação é um passo para a mudança. Para isto, é importante ter bem presente que

 

“Só cuidamos do que amamos e só amamos o que conhecemos”[2].

 

 

[1] GOVLab – Laboratório de Conhecimento Integrado da Linha Temática de Investigação do MARE – é um espaço de diálogo em que participam investigadores dos vários polos do MARE e de outras instituições, especialistas, estudantes de doutoramento/mestrado. Estes, reúnem regularmente promovendo o intercâmbio de conhecimento, ideias e práticas, visando, para além da comunicação e construção do conhecimento, a criação e consolidação de redes e parcerias.

[2] Adaptado de Fernando Fernandez, biólogo, 19-9-2017 - "A gente cuida do que ama, e só ama o que conhece." (https://br.pinterest.com, em 23.5.2021)

*Imagem: atividade meiofauna, Helena Adão