Campanha internacional liderada por equipas da Croácia, Reino Unido, Noruega e Portugal, em cooperação com a Associação Internacional de Nanoplâncton (INA), quer celebrar o papel das microalgas calcificantes que ajudam a regular o clima e a contar a história da Terra.
Mais pequenos que um grão de pó, os cocolitóforos são microalgas marinhas unicelulares que produzem delicadas placas de carbonato de cálcio, os cocólitos. Este exosqueleto calcário não só lhes confere formas deslumbrantes, mas também um papel decisivo no equilíbrio do clima global.
A importância destes organismos reside no facto de capturarem o dióxido de carbono dissolvido no oceano, ajudarem a produzir oxigénio e, quando morrem, os seus cocólitos afundam-se lentamente no fundo do mar, formando sedimentos de calcário – o mesmo material de que é feito o giz – que registam milhões de anos de história climática.
“Os cocolitóforos são únicos porque atuam como pequenas fábricas de carbono”, explica Alex Poulton, investigador do Lyell Centre (Reino Unido). “Transformam CO₂ em estruturas minerais que se acumulam nos sedimentos marinhos e guardam a memória do clima da Terra ao longo de centenas de milhões de anos.”
Do microscópio ao clima global
Todos os anos, os cocolitóforos produzem mais de 1,5 mil milhões de toneladas de carbonato de cálcio, ajudando a armazenar carbono nos fundos oceânicos e a sustentar as cadeias alimentares marinhas. Mas o seu equilíbrio está em risco. As alterações climáticas agravam-se, a temperatura da água do mar aumenta, o oceano torna-se mais ácido, e a disponibilidade dos nutrientes diminui, condições que afetam a sobrevivência destes organismos e, consequentemente, a estabilidade dos ecossistemas e dos ciclos biogeoquímicos que sustentam.
Para reconhecer a importância deste grupo de microalgas e sensibilizar a sociedade para as alterações que os ameaçam, cinco instituições de investigação europeias lançaram uma campanha de comunicação de ciência para instituir o Dia Internacional dos Cocolitóforos, a celebrar-se a 10 de outubro.
A iniciativa é liderada pelo Ruđer Bošković Institute (Croácia), The Lyell Centre da Heriot-Watt University (Reino Unido), NORCE Norwegian Research Centre (Noruega) e pelo MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, em cooperação com a Associação Internacional de Nanoplâncton (INA).
“São os arquitetos invisíveis do oceano”, afirma Jelena Godrijan, do Ruđer Bošković Institute (Croácia). “Cada placa microscópica que produzem torna-se parte de um arquivo geológico que nos conta a história do planeta.”
Portugal na linha da frente
Em Portugal, a investigadora Catarina Guerreiro (MARE/ARNET – Ciências ULisboa e colaboradora do Instituto Dom Luiz (IDL-RG2) tem liderado vários estudos que ajudam a perceber como correntes oceânicas e a deposição de poeiras desérticas influenciam a produção e a distribuição de diferentes espécies de cocolitóforos, e o seu papel na regulação do carbono marinho.
No âmbito do projeto CHASE, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT-CEECIND) e fruto de uma aliança entre o MARE/ARNET e o IDL-RG2, Catarina e a sua equipa de colaboradores nacionais e internacionais analisam amostras de água marinha e de poeiras atmosféricas recolhidas no contexto de vários expedições oceanográficos no Oceano Atlântico, combinando dados de satélite, observações biogeoquímicas, registos sedimentares e experiências laboratoriais para compreender como as poeiras proveniente dos desertos continentais – com foco no Deserto do Sahara – atuam como fertilizante natural para os cocolitóforos.
“Estamos a tentar perceber como processos aparentemente distantes, como as tempestades de poeira no Sahara, podem afetar a produtividade dos cocolitóforos no Atlântico e, por consequência, o equilíbrio global do carbono marinho”, explica Catarina Guerreiro.
A cientista coordena também a participação portuguesa no OAEPIIP - Ocean Alkalinity Enhancement Pelagic Impact Intercomparison Project, um projeto que envolve 19 países e que avalia os potenciais impactos biogeoquímicos do aumento da alcalinidade oceânica. Esta abordagem emergente de remoção de dióxido de carbono atmosférico (Carbon Dioxide Removal – CDR) tem sido proposta como uma possível solução de mitigação das alterações climáticas, ao reforçar a capacidade do oceano de absorver dióxido de carbono sem comprometer a vida marinha.
Um dia para celebrar o invisível
A criação de um dia internacional dedicado aos cocolitóforos é uma forma de aproximar a ciência da sociedade e de dar voz a um grupo de organismos tão discreto quanto essencial. É um apelo à ação global, um convite a repensar a forma como olhamos para o oceano e para os organismos que o sustentam.
Como lembra Sarah Cryer, investigadora do projeto CHALKY e da equipa OceanCANDY, “falamos muitas vezes de baleias, recifes de coral ou regiões polares, mas esquecemo-nos de que a vida microscópica tem um papel essencial no equilíbrio do planeta. Os cocolitóforos mostram-nos que os organismos mais pequenos podem ter o maior impacto.”
Por trás desta iniciativa está uma rede de investigação internacional que une várias equipas, entre elas Catarina Guerreiro, que trabalha para compreender como estes organismos influenciam o ciclo do carbono e o clima do planeta.
“O objetivo da campanha é consciencializar o público em geral, mas também a comunidade científica, para a importância tão transversal que este grupo de organismos minúsculos tem em processos que afetam à escala global o nosso planeta,” afirmou a investigadora portuguesa.
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Ilustrações de Rosie Sheward.
Texto de Catarina Guerreiro e Vera Sequeira