Estudo revela impacto do aquecimento dos oceanos na simbiose entre a lula-pigmeia do Havai e bactérias luminosas

Uma investigação publicada hoje na revista científica Global Change Biology e coordenada pelo investigador do MARE Rui Rosa, revela que o aumento da temperatura do oceano pode comprometer a eclosão da lula-pigmeia Euprymna scolopes e a sua relação simbiótica com bactérias luminosas, afetando negativamente a estratégia de camuflagem noturna da lula, tornando-a vulnerável à predação. 

Alguns animais, como os pirilampos, conseguem produzir luz num processo conhecido por bioluminescência. Mas a maioria das espécies bioluminescentes vive, de facto, no oceano, incluindo cerca de 80% de todas as espécies luminosas conhecidas. Esta luz pode ser gerada diretamente pelo animal ou através de uma simbiose com bactérias luminosas alojadas em órgãos especializados.

É o que acontece nos sepiolídeos, pequenos moluscos cefalópodes que habitam zonas arenosas costeiras, e que apresentam bioluminescência simbiótica. Durante o desenvolvimento embrionário, formam um órgão luminoso especializado que é colonizado por bactérias luminescentes nas primeiras horas após a eclosão. A luz produzida por estas bactérias é utilizada pelos animais como camuflagem durante a noite.

A equipa composta pelos investigadores Eve Otjacques (MARE), Jatico Brandon, Tiago Marques, José Xavier (MARE), Edward Ruby, Margaret McFall-Ngai e Rui Rosa, quis compreender como o aumento da temperatura, da acidez dos oceanos e a intensificação de fenómenos extremos como as ondas de calor marinhas, impactam a simbiose entre a espécie de lula do Havai Euprymna scolopeso e bactérias luminosas Vibrio fischeri.

Os resultados são claros: o aumento da temperatura reduze o sucesso de eclosão e a sobrevivência pós-eclosão, exigindo uma maior densidade de bactérias para que a colonização simbiótica ocorra. Mesmo quando esta se estabelece, a simbiose tende a deteriorar-se ao longo do tempo em águas mais quentes. O estudo revelou ainda que situações de stress térmico como as referidas comprometem a formação completa do órgão especializado em bioluminescência onde o animal armazena uma “reserva” de bactérias para condições adversas.

Esta investigação mostra que, tal como os corais perdem as suas algas simbióticas durante episódios de branqueamento, também estes pequenos cefalópodes sofrem perdas significativas nas suas relações simbióticas perante o stress térmico. A quebra desta simbiose afeta diretamente a capacidade de camuflagem noturna, tornando estes sepiolídeos havaianos mais vulneráveis à predação, o que pode trazer consequências ecológicas relevantes nas águas pouco profundas onde ocorrem.

“Ao pensar no impacto da temperatura em animais simbióticos, geralmente pensamos no branqueamento de corais. Aqui, mostramos que os cefalópodes simbióticos também podem "branquear", sendo sensíveis a altas temperaturas nos estágios iniciais da vida. O que também foi surpreendente foi a formação incompleta do órgão de luz durante a eclosão, como se o desenvolvimento tivesse sido interrompido antes do último estágio de desenvolvimento”, afirma Eve Otjacques autora do estudo.

A quebra desta simbiose afeta diretamente a capacidade de camuflagem noturna, tornando estes sepiolídeos havaianos mais vulneráveis à predação, o que pode trazer consequências ecológicas relevantes nas águas pouco profundas onde ocorrem.

 

 

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Texto de Vera Sequeira
Fotografia de Capa da autoria de Margaret McFall-Ngai obtida através de Animalia.bio